23.1.10

devir-corpo

Outro elemento que compõe e potencializa a singularidade da Luciana é sua produção de textos e desenhos feitos em pedaços de papel. Papelões, embalagens de cigarro, folhas de caderno, papel ofício, e até mesmo paredes e muros do bairro apresentam-se como planos de composição para linhas de fuga e vôos do pensamento. Palavras e desenhos inscritos em papéis traçam um plano de consistência. Em tais artefatos, produzidos por ela, observam-se os mesmos princípios encontrados em seu ato de fala: os recortes de palavras e figuras de pensamento emaranham-se em narrativas disparatadas, situadas em tempos e lugares diferentes, povoados de personagens famosos, celebridades artísticas e políticas. Ela faz uma colagem de termos e nomes próprios, uma colagem de termos e nomes em inglês, francês e espanhol, e em meio às essas linhas sinuosas de palavras surgem atravessamentos em linhas de desenhos fantásticos. Mulheres com cabeça de bode, dragões de sete cabeças, fadas, guerreiros, pêssegos com cara de mulher, castelos, praças, carros, árvores, flores, pássaros, santos, cruzes, outros dragões, padre com gesto obsceno, carros, aparelhos de TV, antenas, filmadoras, corpos mutilados, tudo misturado, entre palavras e figuras, dispostos na superfície do papel, compondo um plano consistente, potente, investido de força imanente. Palavras muito específicas se misturam aos desenhos formando uma textualidade aberta a inúmeras possibilidades de sentido, remetendo a infinitos acontecimentos. Textos e desenhos sobre um pedaço de papelão rasgado compreendem uma superfície de intensidades, de fluxos de pensamentos, de velocidades. É um devir-corpo de Luciana que se atualiza em linhas sobrepostas numa superfície lisa, reutilizada. Esses papéis, que são distribuídos por ela mesma entre um ou outro transeunte, percorrerão outros trajetos, atravessarão outros lugares, marcarão outras matérias, outros corpos, e serão atualizados por novos agenciamentos.

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